13 de maio de 2010

Ninguem me contou - De Helena e Rachel


   Sentimento de orgulho pelo belo texto da afilhada e sobrinha. Muito mais do que isso, uma percepção que nós, educadores, temos muito que aprender para poder formar o caráter dos nossos filhos e criá-los para vida e não para nossas expectativas.

     Enquanto a sociedade não consegue formar Educadores, temos que seguir esse exemplo. Promover em nós mesmos essa auto-crítica e moderação é o caminho com mais oportunidades de acertarmos. O " E daí " da Helena é um gesto de questionamento, de não estar na zona de conforto, de querer saber por que! Sorte dela que tem nos seus Educadores, Rachel e Arthur, a inteligência de não podá-la por inteiro e sim, apenas indicar caminhos para que o " E daí " seja lapidado do tom sincero e contundente para o tom de negociação e conciliação. Mas, nunca podar o " E daí " que será usado por Helena para mudar o seu Mundo.

Enfim, o bom daqui é o texto da Rachel e Helena. Ando, confesso, impaciente com nosso letárgico processo de transformação de onde estamos para onde deveríamos estar.


NINGUÉM ME CONTOU

Publicado na Revista Pais&Filhos de Maio de 2010

Que eu ouviria “E daí?” da minha filha


Rachel morreu de raiva quando ouviu a filha dizer a frase com prepotência. Mais tarde, descobriu o lado positivo da afronta

Ninguém me disse como lidar com um “E daí?”. Parece uma frase inofensiva. Pode ser, se lida de relance. Mas tente escutá-la. Imagine uma criança de 5 anos com as mãos na cintura, dizendo “E daí?”. O mesmo que “não me importo” ou “não tô nem aí pra você ou para o que você diz ou vai fazer”.

Acredito que uma criança de 5 anos não tem a exata medida do que diz – se eu, aos 35 anos. ainda me pego falando sem pensar, imagine ela, que está se dando conta de seus desejos e aprendendo a lidar com aquilo que a desagrada. Só que, ainda assim, é duro ouvir um “E daí?”, que, dependendo da entonação e dos trejeitos, pode tirar qualquer um – ou uma boa parte das pessoas – do sério (incluo-me entre aqueles menos tolerantes).

Fico pensando: se fala assim aos 5 (ou se deixo que continue falando assim), como será quando tiver 15?

Esse “E daí?” revelou que: “daí” hoje não tem sobremesa e também não tem historinha. A noite acabou aí. Fomos pro quarto, sem TV, juntas. Ficamos na cama, abraçadas, quietas, tristes com o que aconteceu. Com o pouco caso de uma e a raiva da outra. Ao olhar de fora, como num raio X, talvez as reações pudessem ser outras. Talvez se eu fosse espiã de mim mesma adotasse outra postura – menos cheia de impaciência e raiva. Mas a questão é: como ser ou agir como se estivéssemos fora de nós mesmos e do contexto que nos cerca? Como se abstrair dos sentidos e dos impulsos?

Certa ou errada, ou parte certa e parte errada, espero que não haja outro “E daí?”.  

E se houver? E daí?

E daí que muitos meses após ter escrito o texto acima, que nasceu de uma desobediência de rotina, carregada das palavras soltas de uma criança de 5 anos, me dei conta de que é mais difícil ouvir um “E daí?” do que dizê-lo.

Quem o diz está se expressando com liberdade e mostrando que não concorda com a regra. Um pouco fora do tom, por conta da pouca idade, a voz saiu de um jeito que me desconcertou, deu vontade de “voar” em cima.

Mas será que o problema reside no “E daí?”? Será que quero e devo podar o “E daí?” da minha pequena, levando-a a encobrir o que sente, levando-a a desistir de enfrentar o outro, desafiá-lo? A casa é a primeira reprodução do mundo. Os pais são os primeiros a serem desafiados. Depois de tanto tempo, passei a entender que deveria “aparar as arestas”, não impedi-la de um próximo “E daí?”, mas incentivá-la a aumentar sua argumentação, sua capacidade de reação. Reaja, com respeito e educação.

Afinal, de quantos “E daí?” nascem novas ideias ou projetos? As pessoas que dizem a temida frase são profissionais tão confiantes a ponto de se exporem sem medo e sem arrogância. Esse é o ponto. O difícil ponto. Manter um “E daí?” saudável, sem empáfia, com respeito ao próximo, mas também com respeito a si mesmo e a seus sentimentos. Melhor colocar para fora do que manter abafado ou reprimido. Está aí o grande desafio dos pais – ou pelo menos o meu desafio – saber escutar um “E daí?”sem perder o controle da situação, para ajudar os filhos a encontrarem o tom certo de suas inquietações, reclamações ou contestações. Eles têm de saber falar e nós, escutar.

Rachel Facó, mãe de Helena, de 6 anos, é jornalista e optou por exercer seu papel de Educadora. O texto também pode ser lido no link aí de baixo:




 

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